Banco comunitário

Moedas sociais

Rafael de Barros Maia

1. INTRODUÇÃO

Toda moeda é: global; virtual; social. A característica global representa o elemento de conexão entre o local, regional e mundial, isto é, ela assume importância significativa nas estruturas federativas dentro desse aspecto global. A moeda é virtual por ser instituição criada pelo conhecimento humano e definida por suas funções. Por fim, todas são sociais por funcionarem como instrumento eficiente para a realização de trocas na sociedade.

2. O QUE SÃO MOEDAS SOCIAIS

Moeda social consiste em um instrumento de natureza e estrutura contratual, com potencial para solucionar ou apenas atenuar o problema do “desencaixe” entre disponibilidade de capital (recursos disponíveis) e necessidades não atendidas. Em outras palavras pode-se dizer que são moedas complementares. Isto é, existe a possibilidade de tornarem-se instrumentos de políticas públicas de finanças solidárias. Tal fato é possível pois são totalmente compatíveis com a política monetária, desde que esteja sob a responsabilidade dos bancos centrais.

De acordo com o exposto no artigo 6º da Constituição Federal, as moedas sociais funcionam como meio alternativo para viabilizar o acesso aos direitos sociais, in verbis:

São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Para o funcionamento das moedas sociais temos algumas peças fundamentais como:

·###Instrumentos ou sistemas de pagamentos

Criados e administrados pelos usuários, por meio de organizações sem fins lucrativos, com fundamento em relações econômicas de cooperação e solidariedade dos participantes de determinadas comunidades, independentemente do exercício de qualquer forma de intermediação financeira.

Coordenação e administração de atividades econômicas locais

Um conjunto de arranjos contratuais que especificam interesses comuns e estabelecem mecanismos de participação dos associados e os métodos de coordenação e administração de atividades econômicas locais, permitindo que os indivíduos exercem maior controle sobre a criação e uso da moeda que utilizam para a realização de trocas, de acordo com a vontade política da comunidade.

Fator humano – capital social

Riqueza não financeira, referente à aplicação do capital humano no processo de produção, circulação e distribuição de bens e serviços produzidos na economia real (não financeira).

Tendo como embasamento o primado do trabalho e a finalidade de visar o bem estar e a justiça social, o uso das moedas sociais corresponde a uma maneira de promover a integração das pessoas ao mercado de trabalho de tal maneira que não afeta o poder dos bancos centrais na função de controle de quantidade de moeda e crédito. Além disso, ela não ameaça o papel dos bancos centrais em relação aos sistemas de pagamentos nacionais e transnacionais. Ou seja, ela não diz respeito à exploração comercial de dinheiro nem de um mero programa de transferência de riqueza da população mais rica aos pobres.

Vale ressaltar que, em hipótese alguma, as moedas sociais colocam em risco a estabilidade do sistema financeiro, servindo tão somente como um instrumento para lidar com as falhas estruturais dos próprios sistemas.

3. O FUNCIONAMENTO DAS MOEDAS SOCIAIS

O capítulo a seguir apresentado apresenta informações e análises no que tange à visão dos participantes sobre a moeda social com vistas a identificar o alcance da experiência e sua relação com um projeto e a sociedade.

Em assonância com um artigo publicado pelo Banco Central brasileiro (2010) acerca das moedas sociais, há um vertente que enxerga as moedas sociais pela necessidade de um circulante local para ampliar a renda, melhorar a produção local através de uma linha de funcionamento (microcréditos) e outra linha que estimula o consumo local, através de um cartão de crédito próprio; “a moeda complementa em torno de trinta por cento de renda das famílias e tem permitido gerar atividades de trabalho”; a moeda social “considerada pela credibilidade da associação, é um instrumento de alavancagem para o consumo mais equilibrado. O usuário fica fascinado, sai do fiado na caderneta e o crédito não é a favor, tem respeito, auto estima. Se liberta”.

Uma segunda vertente vê a moeda como uma “estratégia” ou uma ferramenta para desenvolver a comunidade, dinamizar a economia local – serviços e produtos, além de estabelecer trocas de responsabilidades e ajuda mútua;

Uma terceira vertente apresenta uma visão da moeda social associada às transformações das condições de vida e ao consumo para a inclusão social. “o Banco Comunitário é tão importante para iniciar os processos de inclusão e transformação social, como a linha de crédito para estimular a produção local. É certo que quanto maior for o número de famílias beneficiadas no município, maior será a riqueza gerada localmente. Isso favorece as populações gerando trabalho e renda”; “a moeda vai transformar a vida, incentivar as pessoas a produzirem e consumirem na comunidade. Aumenta a auto-estima das pessoas e valoriza o trabalho”; “é um meio de integração e cidadania”. Finalmente, a quarta visão considera importante a moeda social, mas aponta algumas dificuldades com as quais se depara “acreditam que a moeda social melhorará a vida deles, porém, a população ainda não tem uma boa relação com o banco devido a problemas políticos partidários”; e, “em primeira mão, tem gente que confunde até com banco imobiliário. Na verdade de todos os bairros compreendidos pelo banco, somente oito possuem estabelecimentos que aceitam a moeda social”.

4. MOEDA NACIONAL

· Moeda fiduciária oficial.

· Três funções: unidade de conta, meio de troca e reserva de valor.

· Curso legal e uso obrigatório por lei, garantida e monopolizada pelo Estado.

· Conectada diretamente com as finanças públicas (dívida pública e direito público)

· 95% - moeda bancária privada (propriedade privada e dívida privada)

  • Depósitos bancários

  • Juros compostos

  • Crescimento exponencial

· Exclusão social

  • Pessoas não bancarizadas

  • Custo do crédito

  • Concentração financeira

5. MOEDA SOCIAL

· Complementar à moeda fiduciária oficial.

· Não cumpre todas as funções da moeda (meio de troca).

· Ninguém é (ou pode ser) obrigado a aceitar uma moeda social ou a participar de um sistema de moedas sociais.

· Direito dos contratos e direito das obrigações (obrigações privadas e direito privado)

· Reciprocidade, mutualismo (propriedade comunitária)

  • Diversos tipos de incentivos à circulação

  • Evita juros compostos

  • Crescimento similar ao da economia real.

· Inclusão Social (atividade do sistema funciona de maneira anticíclica)

  • Nível de emprego na economia formal.

  • Política monetária.

  • Desconcentração financeira.

6. MOEDAS SOCIAIS NA ECONOMIA MUNDIAL

A hegemonia de algumas moedas no mercado financeiro internacional como o dólar e o euro gerou o controle de alguns conglomerados empresariais no cenário mundial, nesse mesmo sentido percebe-se que quando grandes moedas se desvalorizam consequentemente crises econômicas ao redor do mundo acontecem e essas empresas acabam sofrendo consequências, por mais óbvio que isto pareça ser não é de fato tão simples, a desvalorização de uma moeda se da por inúmeros fatores: guerras, quebra de tratados internacionais, perda de produtos não renováveis, etc. São problemas muito complexos que necessitam um profundo estudo pra obter resultados positivos e poder sair da crise instaurada.

Neste cenário, vários países vêm ao longo do tempo buscando soluções alternativas quando uma moeda forte se desvaloriza, temos então os Clubes de Troca, estes clubes já existem atualmente em uma série de países como Canadá, Estados Unidos, Japão, Austrália, Tailândia, Equador, Indonésia, Brasil, etc., nestes clubes cada moeda adotada apresenta um nome próprio e suas regras para serem usadas, o objetivo destas moedas sociais é claro e simples: criar um circuito financeiro paralelo ao já instaurado permitindo a venda e compra de produtos e serviços que consequentemente forma novas alternativas de auferir lucros mantendo a saúde financeira de sua empresa em meio a uma crise.

7. MOEDAS SOCIAIS E O SEU PAPEL NO DESENVOLVIMENTO

As moedas sociais assumem um papel importante no desenvolvimento econômico uma vez agem como um represamento de recursos na economia local justamente em função de um mercado de trabalho e dessa forma, beneficiam primeiramente as pessoas da economia local.

Verifica-se, como já exposado acima, que as moedas sociais facilitam a política de trocas de uma comunidade. Dessa forma, auxiliam não só na economia da localidade, mas na sua articulação, comercialização de produtos e distribuição nos recursos entre a comunidade, o que vai além do que nos proporciona o sistema capitalista. A moeda social permite um mercado complementar.

Para o desenvolvimento social e econômico, a moeda social se mostra imprescindível, sobretudo para superar períodos de recessão financeira. Na Argentina, por exemplo, entre os anos de 2000 e 2001, o número de participantes em clubes de moedas de troca era 800 mil. Em 2002, com a crise, esse número subiu para 6 milhões.

Dessa forma, demonstra-se a força da moeda social, sobretudo na Argentina, um país com 10 anos de história de pluralidade monetária. Ou seja, os clubes de troca proporcionaram, de certa maneira, uma resposta similar às diligências políticas: enquanto o governo argentino criava moedas para os Estados, as pessoas criavam moedas para seus bairros. Com tal característica restrita deste artifício, a moeda social ajuda a diminuir a centralização da riqueza (capitalismo) e promover a inserção social, essencial para o desenvolvimento.

Não existe, no mundo, uma experiência semelhante à política das moedas sociais. As pessoas, sem auxílio do governo, podem, sem violar as regras jurídicas do capitalismo financeiro, realizar um novo mercado.

O uso da moeda social pode baixar os preços e inserir pessoas de baixa renda no exercício da economia local, inclusive gerando empregos.

Esse desenvolvimento já foi constatado na prática, em nosso país, por exemplo, na cidade de São Bernardo do Campo-SP.

O banco forneceu a moeda social denominada “comissari” aos moradores dos bairros periféricos da cidade, e, com o mesmo valor do real, o “comissari” impulsionou ferozmente os negócios dos empreendimentos locais. O valor da moeda social foi inegável no desenvolvimento daqueles bairros.

Caso ocorra atraso no pagamento dos créditos, a própria comunidade cria o regramento para a quitação do crédito conferido.

Por fim, a título de melhor ilustrar o papel das moedas sociais no desenvolvimento, é possível elencar algumas razões para o esclarecimento de sua importância, dentre as quais verifica-se:

A. REPRESAMENTO DE RECURSOS NA ECONOMIA LOCAL EM FUNÇÃO DE UM MERCADO DE TRABALHO LOCAL.

  • Os recursos que circulam na economia local, beneficiam primeiro as pessoas da economia local.

B.ORGANIZAÇÃO (OU REORGANIZAÇÃO) DA PRODUÇÃO, CIRCULAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E CONSUMO LOCAIS.

  • Recursos locais subutilizados são direcionados para atender às necessidades locais não atendidas.

C. CRIAÇÃO DE RIQUEZAS À PARTIR DE RECURSOS QUE SE ENCONTRAM DISPONÍVEIS NA ECONOMIA REAL.

  • O aumento da quantidade de moeda social corresponde ao aumento das transações realizadas pelos participantes na economia real

D.AUMENTO DO POTENCIAL DE ARRECADAÇÃO TRIBUTÁRIA DOS MUNICÍPIOS (ISS, TAXA DE CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA).

E.REDISTRIBUIÇÃO DE RECURSOS POR MEIO DO COMÉRCIO LOCAL.

  1. CONCLUSÃO

As moedas sociais tem como princípios o conceito da economia solidária de articulação e trocas da economia local, sua finalidade é promover a comercialização de seus produtos e serviços.

Moeda esta que possui circulação restrita, sendo moeda local, que auxilia para a diminuição do poder centralizador da economia capitalista globalizada e promove a inclusão social.

A lógica das moedas sociais está além do capitalismo, pois também trata-se de relações de solidariedade e cooperação mútua.

Ainda há um grande divergência com relação ao seu aspecto legal, além de outras questões citas como custos, riscos, viabilidade econômico financeira, compatibilidade com a política monetária e a exigência da estabilidade do sistema financeiro. Trata-se de uma forma de sinalizar para as mudanças na economia, vindas da busca de solução para os problemas de desemprego e exclusão social.

CO-AUTORES:

CAIQUE FÉLIX SERRÃO

http://caiquesf.jusbrasil.com.br/

ROQUE PIRES

http://roquejr.jusbrasil.com.br/

FÁBIO OTTAJANO

http://ottajano.jusbrasil.com.br/

  1. BIBLIOGRAFIA

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituição/Constituição. Htm

http://www.ifil.org/rcs/biblioteca/burigo.htm (tópico 4)